domingo, 21 de junho de 2015


   UM OLHAR SOBRE A MEDICINA CHINESA

         A ANATOMIA

O culto dos mortos interditava os estudos anatómicos, o que tornou a anatomia chinesa fantasiosa. A título de exemplo, o esqueleto humano seria composto por 360 ossos, não porque os tivessem contado (são 206, com variações) mas porque era esse o número das divisões do zodíaco.
A tradição chinesa privilegia o número 5. São 5 os elementos constituintes da natureza, 5 os planetas principais, 5 as cores mais admiradas e 5 os pontos cardeais (além dos nossos, incluem o Centro). Teriam de ser 5 as vísceras principais: fígado, baço, coração, pulmões e rins, todas dependentes do princípio feminino Yin. São também 5 as vísceras dependentes do princípio masculino Yang: intestino delgado, intestino grosso, estômago, bexiga e vesícula biliar. 


A falta de observação direta era compensada com a imaginação.
   Deixo aqui um fragmento de texto do médico português José Caetano Soares, que trabalhou em Macau durante muitos anos. Faz parte de «Notas sobre a Medicina Chinesa» e foi publicado pelo padre Manuel Teixeira no seu livro «A Medicina em Macau».

O tórax é fechado por três esternos, comporta o coração - órgão primordial, situado em pleno epigastro ou na parte alta da região do estômago e que, como particularidade, tem incluído um osso pequeno com a forma de uma sapeca (moeda). De cada lado estão suspensos à coluna os dois pulmões a constituir uma espécie de fole de 24 tubos, com grande número de orifícios, dos quais provém o som. A laringe atravessa-os no seu caminho para o coração. Dos órgãos abdominais, não só o fígado está separado e é independente da vesícula biliar, como o intestino delgado comunica com o coração, a urina atravessando aquele na sua trajectória para a bexiga. O rim, através da medula, liga-se com o cérebro.
Os centros nervosos praticamente não existem; só o cérebro, considerado como a continuação da medula, se chama por isso a medula do crânio. Não há diferença entre nervos e tendões, a ambos cabe a designação de «can».

Não me vou alargar sobre a anatomia e a fisiologia, tal como são entendidas pela medicina tradicional chinesa. Mencionarei apenas alguns órgãos principais e deixarei para o fim uma referência breve ao papel do «triplo aquecedor».

Coração - é o órgão principal e governa todas as vísceras. Está associado ao fogo, ao verão e ao sul.



Localiza-se «acima do fígado, baço e diafragma, tem a forma de uma flor de lótus e pesa 12 taéis.»
Fui procurar o valor do tael. Equivale a pouco menos de 30 gramas. A estimativa chinesa aproxima-se dos 250 a 400 gramas que pesa um coração saudável.
O coração está ligado por tubos aos outros órgãos principais. Comanda o fluxo sanguíneo e abriga o shen. Controla a atividade mental. É a sede do amor e da afeição. É representado pela mitológica «ave escarlate».
O estado do coração revela-se pela língua e pela face
Curiosamente, para os chineses, o pericárdio é um órgão independente, destinado a proteger o coração. 

Pulmões – Governam o Qi. Por estarem expostos ao exterior, constituem o mais frágil dos cinco órgãos Yin.


Fazem descer o Qi do ar pelo nariz, espalham-no e fazem subir os restos impuros do Qi, disseminando-os no ar.
Controlam a água do corpo. No movimento descendente, liquefazem a parte gasosa do ar e enviam-na para os rins. No movimento ascendente, fazem evaporar o líquido, que se espalha, sob a forma de suor e doutras secreções.


Têm também um atributo moral: são a sede da equidade. Estão associados ao metal, ao outono e ao oeste. O seu espírito toma a forma de um tigre.
Mostram-se através do nariz e dos cabelos.

Baço – é o órgão mais importante da digestão. Tem um papel de relevo no aproveitamento da energia dos alimentos e na sua transformação em sangue e em Qi. Mantém o sangue dentro dos vasos e encarrega-se do seu transporte por veias e artérias. Comanda os músculos, os tendões e os movimentos.


O baço é a sede da confiança.
Está associado ao elemento terra, aos meses que vão do fim do verão ao começo do outono e à direção centro. É simbolizado pela fénix.


O seu estado mostra-se pelos membros e pelos lábios. Se falta a harmonia ao Qi do baço, o doente deixa de ser capaz de diferenciar os cinco sabores fundamentais (doce, amargo, salgado, ácido e picante).

Fígado – promove a harmonia do fluxo do sangue e do Qi pelo organismo. Ajuda a digestão. Armazena o sangue, o qual «sobe» quando é necessário para o esforço físico e regressa quando deixa de ser preciso.


 É a sede da bondade.
Está associado ao elemento madeira, à primavera e à direção leste.
É representado pelo dragão.


Revela-se pelas unhas e pela vista. Quando lhe falta a harmonia, as unhas tornam-se baças e quebradiças e a vista falha, podendo tornar-se incapaz de diferenciar as cores.

Rins – Contribuem para a digestão e para a circulação da água e dos fluidos orgânicos.


Por armazenarem o Jing, a essência que regula a sucessão das fases da vida, são considerados os guardiões da força vital.
Associam-se ao elemento água, ao inverno e à direção norte.
São representados por uma serpente com cabeça de dragão enrolada numa tartaruga.


Parece-nos estranho serem considerados a sede da sabedoria, mas a medicina chinesa está repleta de conceitos que parecem improváveis aos nossos olhos.
O funcionamento inadequado dos rins prejudica as funções do Jing e traduz-se por esterilidade, impotência sexual e envelhecimento precoce.

O TRIPLO-AQUECEDOR é uma unidade funcional encarregada de produzir calor a partir da transformação dos alimentos e de regular o equilíbrio térmico. A parte superior engloba o diafragma, o coração e os pulmões. A parte média é constituída pelo estômago e pelo baço. O aquecedor inferior assenta no fígado, rins, bexiga e intestinos.
Cabe-lhe controlar a atividade do Qi no organismo e a respiração. Regula ainda o fluido da energia vital, do sangue e dos outros líquidos corporais, e a distribuição dos nutrientes e do Qi. Alimenta a energia sexual.

Gravuras: retiradas do livro «Medicina Chinesa - em busca do equilíbrio perfeito».

























Sem comentários:

Enviar um comentário