BANHA DE COBRA E TERIAGA
O cirurgião Joaquim Barradas apresentou
recentemente o seu terceiro livro. Chamou-lhe Banha de Cobra e Teriaga.
Em centena e meia de páginas passou em
revista toda a História da Medicina ocidental.
A escrita é elegante e as opiniões expressas
são cuidadosamente fundamentadas. O livro é de leitura fácil e agradável.
A Teriaga remonta ao tempo de Mitrídates e às
guerras do Ponto. Incluía mais de meia centena de componentes e terá sido
utilizada inicialmente como antídoto para os venenos comuns. Julgava-se que o efeito final seria superior
ao somatório das virtudes de todos os produtos simples que a integravam.
Depressa passou a ser usado como medicamento
capaz de combater quase toda a espécie de doenças. Houve quem julgasse que
estava ali a panaceia universal. Seria boa para o tratamento das doenças
contagiosas, peste, febres malignas, bexigas, mordeduras de animais venenosos,
cólica ventosa, paralisias, epilepsia, apoplexia, letargo e ainda para doenças
mentais.
Incluía, entre os seus componentes principais,
o ópio e a carne de cobra.
É sabido que as serpentes possuem uma
quantidade diminuta de gordura. O termo “Banha da Cobra” deriva dos excipientes
gordos que os preparadores lhe incorporavam.
Galeno, médico grego instalado em Roma, foi,
para o bem e para o mal, uma das personagens que mais influenciaram as Medicinas árabe
e europeia. Descreveu em pormenor o método de preparação da carne de cobra, de
forma a poder ser incluída na Teriaga.
A Teriaga foi largamente utilizada em toda a
Europa até ao final do século XVIII, tendo o seu uso persistido em alguns
países no início do século XIX. Foi o médico britânico William Heberden
quem, em 1745, publicou um pequeno opúsculo em que questionava a validade do
efeito terapêutico da Teriaga. A publicação teve eco na Inglaterra, primeiro país em que a Teriaga deixou de ser usada. Tinha reinado entre os medicamentos administrados a humanos durante dois milénios.
O autor termina o livro com reflexões sobre a
validade do conhecimento científico. No seu entender, a verdade é quase sempre
provisória e os avanços registados por cada geração de investigadores tendem
muitas vezes a pôr em causa as ideias dominantes em épocas anteriores.