JOSEF MENGELE
Instigado pelo pai, que dirigia na terra natal uma florescente empresa de máquinas agrícolas, Josef Mengele aceitou casar-se com a cunhada Martha. Fê-lo, em parte, para herdar uma fatia substancial da empresa familiar e, noutra parte, para se vingar da memória de Karl, o filho segundo e favorito de sua mãe, falecido cedo.
Em
1956, com o nome de Gregor, Mengele conseguiu obter um passaporte válido por
três meses e voou para a Suíça num DC-7 da Pam Am. Foi encontrar-se com Martha
nos Alpes Suíços.
A viúva do irmão esperava-o num hotel de luxo. Tinha consigo duas crianças: o seu próprio filho, Karl-Heinz, e Rolf, o filho de Mengele. O visitante foi apresentado aos meninos como sendo o tio Fritz, da América. Rolf estava convencido, desde muito pequeno, de que o pai tinha morrido em combate na Rússia.
Josef Mendele com o filho Rolf, ainda muito novoMartha
e Josef Mengele agradaram-se um do outro. Ela parecia ser uma boa mãe e era uma
nazi convicta. Não sendo propriamente bonita, era uma mulher sensual de 35
anos. Por outro lado, Mengele apreciou a pontualidade e os bons modos dos dois
rapazes. A ligação era possível e poderia ser agradável. Josef e Martha
passaram logo juntos a primeira noite no hotel.
Dez dias
depois, Martha e as crianças regressam de comboio a Günsburg, enquanto Josef
viajava de automóvel com o seu amigo Seldmeier. Não voltava à terra natal desde
novembro de 1944.
O pai
e o irmão procuraram convencê-lo a permanecer. Achavam que a situação, na
Alemanha, se alterara consideravelmente. Por outro lado, a família Mengele tornara-se
a mais poderosa do burgo.
Josef,
contudo, sabia que não podia ficar. O seu nome continuava a constar de uma
lista de criminosos de guerra e ele seria reconhecido facilmente em qualquer rua
da cidade. A sua vida teria de continuar a decorrer na Argentina, onde Martha e
Karl-Heinz se lhe iriam juntar.
Dias
depois, apanhou um avião de regresso à capital argentina.
Mengele
tinha 45 anos. Pretendia estabilidade e paz. Adquiriu uma casa magnífica em
Buenos Aires.
Para
voltar a casar e para ter acesso normal ao crédito bancário, necessário para a
expansão da sua empresa, era necessário recuperar o seu nome verdadeiro. Helmut
Gregor deveria desaparecer.
Não
foi fácil dar a volta à pesada burocracia argentina e conseguir que a verdade
fosse reconhecida. Mengele confessou que vivera no país com uma identidade
falsa no decurso dos últimos anos. Indicou à Embaixada da Alemanha Ocidental na
Argentina o seu nome verdadeiro e as datas que poderiam ter significado para os
registos: o do seu nascimento e o do divórcio de Irene Shoenlein. Declarou que
nascera em Günsburg e forneceu a sua morada em Buenos Aires. Finalmente, a 11
de setembro de 1956, Josef Mengele passou a ser ele próprio, de acordo com a
Embaixada alemã. Cerca de dois meses depois, as autoridades argentinas
emitiram-lhe um novo Bilhete de Identidade.
O
tempo gastou-se e chegou a altura de Martha e Josef casarem. Escolheram Nueva
Helvetia, no Uruguai, para local do evento (civil) e deslocaram-se de avião até
Montevideu. À cerimónia, compareceu um número restrito de amigos. Seguiram-se
três semanas de lua-de-mel.
No
regresso a Buenos Aires, Mengele encontrou na caixa de correio uma convocatória
da polícia argentina. Deveria ter-se apresentado na esquadra de Olivos três
dias antes.
Mal
começara a falar com o seu advogado quando lhe irromperam na casa dois sargentos
da polícia. Josef Mengele foi algemado e conduzido à prisão. Era acusado de
exercício ilegal de Medicina.
Os
médicos alemães residentes na capital Argentina estavam debaixo de fogo. Para
agravar a situação, uma rapariga de 15 anos, filha de um grande industrial,
morrera dias antes em consequência de um aborto. Ao ser preso, o médico culpado
denunciara os colegas à polícia. O nome falso de Mengele, Helmut Gregor, constava
na lista.
Gregor-Mengele
desculpou-se como pôde. Afirmou que nada tinha a ver com os acontecimentos da
Alemanha. Quanto aos abortos, tratava-se de factos antigos e tudo com as suas
pacientes tinha corrido bem. Estava arrependido, apesar de muitas vezes se ter
tratado apenas de fazer favores a amigos cujas filhas haviam dado maus passos.
Na
presença do advogado, propôs um acordo ao oficial da polícia. A resposta
imediata foi a detenção.
Mengele sentia-se mal. A cela da prisão era malcheirosa, a cama tinha
piolhos e a comida era difícil de tragar.
Ao terceiro dia de custódia, foi chamado ao mesmo oficial. Negociaram e
chegaram a acordo. A custo de 500 dólares americanos, o processo de Mengele foi
guardado no arquivo pessoal do polícia corrupto.
Tudo
parecia voltar ao normal.
Não
aconteceu assim. Ernst Schnabel publicara meses antes, na Alemanha, um livro
intitulado “No rasto de Anne Frank”. A obra teve grande divulgação.
Várias
publicações regionais alemãs, entre as quais o diário Ulmer Nachrichten,
publicaram excertos do livro. Ulm fica situada a menos de 40 quilómetros de
Günzburg, a terra em que Mengele nascera e onde o pai detinha a fábrica de
maquinaria agrícola.
Em agosto
de 1958, o Ulmer Nachritchen recebeu uma carta anónima e enviou-a à polícia.
Mengele pai teria contado à antiga governanta que o filho, em tempos médico de
Auschwitz, fugira para a América do Sul.
Mengele
assustou-se. Com o afastamento de Perón, a Argentina deixara de constituir um
refúgio seguro.
Dirigiu-se
apressadamente ao Paraguai. Viajou no seu próprio automóvel e instalou-se em
Assunção.
Os
amigos germânicos aconselharam-no a comprar terras e a ficar. O Paraguai de
Stroessner era semelhante à Argentina de Perón.
Arranjaram-lhe
um emprego de distribuidor de um adubo que estava a ter larga divulgação na
Europa.
A
família veio visitá-lo com regularidade ao longo dos últimos meses desse ano.
No entanto, o prazo de validade do seu visto no Paraguai estava a esgotar-se.
No início de 1959, Mengele regressou a Buenos Aires.
Iria
demorar-se lá pouco tempo. Eduard Wirths, antigo prisioneiro em Auschwitz e Dachau,
dedicava-se à caça de nazis. Em 1954, descobrira casualmente o anúncio do
divórcio de Josef Mengele e dera conta da participação de um advogado argentino
no processo. Convenceu-se de que o antigo médico nazi vivia na Argentina e
comunicou as suas suspeitas à justiça alemã. Após várias diligências falhadas
conseguiu que, em 1959, o Ministério Público da Alemanha Federal elaborasse um
longo processo sobre os crimes do médico carniceiro de Auschwitz. Estava
anexado ao mandado de captura datado de 5 de junho.
Josef Mengel é acusado de ter tomado
parte, ativa e decisivamente, em triagens nas enfermarias de prisioneiros
inaptos para o trabalho no campo devido a fome, privações, exaustão, doença,
abusos ou outros motivos, e cuja rápida recuperação não era esperada, ou sobre
os que sofriam de doenças contagiosas ou particularmente desagradáveis à vista,
como certas afeções cutâneas.
Os selecionados eram abatidos por meio
de injeções letais, fuzilados, ou mortos através de dolorosa sufocação por
ácido cianídrico nas câmaras de gás, de modo a arranjar lugar para os
prisioneiros “aptos”, selecionados por ele ou por outros médicos SS, da forma
acima mencionada. Ministradas pela sua própria mão ou por agentes sanitários
das SS sob sua supervisão, as injeções letais introduziam fenol, petróleo,
evipal, clorofórmio ou ar na circulação sanguínea, em especial no coração.
Também foi acusado de supervisionar triagens no campo ou na enfermaria, quando
os referidos agentes ou ele próprio atiravam cristais de Zylon B (uma forma de
ácido cianídrico) para as condutas de ventilação dos quartos onde se amontoavam
os condenados à morte.
O
arguido Josef Mengel é acusado de ter realizado experiências científicas em
prisioneiros vivos para publicação académica, movido pela sua ambição e pela
progressão da sua carreira profissional. À luz do método usado nas
experiências, ele tinha, em absoluto, a intenção de que as vítimas morressem e
dava pouco valor às suas vidas. Muitas vezes, morreram apenas para fazer
avançar os seus conhecimentos científicos e a sua formação académica.
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