UM CÁLCULO CORALIFORME
Apareceu-me na consulta
uma doente com uma hérnia discal lombar a que pus indicação operatória. Como
referia também queixas urinárias, enviei-a a um Colega urologista cujo nome
será gentil não revelar. Propôs também operá-la.
Era preciso saber qual das
especialidades deveria ter prioridade. Contactámos por telefone.
─ Opero eu primeiro –
propôs o meu colega e amigo. A senhora tem um grande cálculo coraliforme.
Estranhei não o ter visto
nas radiografias simples da coluna lombar, nem na radiculografia. Devo
sublinhar que a história que relato se passou antes da T.A.C.
Nada tinha a opor à sua
opinião.
Dois meses mais tarde, a
doente voltou à minha consulta.
─ Afinal, o Senhor Doutor
urologista diz que eu não preciso de ser operada por ele. E olhe que cheguei a
estar internada…
O colega telefonou-me a
explicar a situação. Naquele tempo, a consulta de Urologia no Hospital do
Desterro fazia-se numa espécie de mesa comprida partilhada por vários médicos e
doentes. As radiografias que lhe foram ter à mão mostravam um cálculo
coraliforme de tamanho impressionante.
A doente foi internada já
com a cirurgia agendada. Na véspera, o meu colega foi rever o processo clínico,
como fazia sempre. A mulher não tinha cálculo nenhum. As imagens em que o
diagnóstico se baseara pertenciam a uma doente que estava, na manhã da consulta,
sentada a seu lado.
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