RELAÇÃO MÉDICO DOENTE
NA LITERATURA PORTUGUESA
JÚLIO DINIS
Joaquim
Guilherme Gomes Coelho (1839-1871), nasceu e morreu no Porto. Aluno brilhante,
chegou a ensinar na Escola Médico-Cirúrgica da cidade, mas a doença fê-lo
abandonar o trabalho. A tuberculose, que lhe levara a mãe e todos os oito
irmãos, vitimou-o aos 32 anos de idade.
Sob o pseudónimo
de Júlio Dinis, publicou uma série de livros que foram considerados “dos mais
suaves e ternos romances portugueses”, lidos e relidos por gerações sucessivas
de adolescentes.
Em “As Pupilas
do Senhor Reitor” Júlio Dinis criou a figura poderosa de João Semana, velho
médico bonacheirão, também proprietário rural, que não dispunha (aparentemente)
de instalações semelhantes aos consultórios médicos de hoje e começava manhã
cedo as suas visitas domiciliárias, montado numa égua. Amigo de toda a gente
(e, em especial, do “Senhor Reitor”), tratava os pobres e os menos pobres da
aldeia com a mesma atenção e interesse. Naquele tempo, ainda não se imaginava
um Serviço Nacional de Saúde.
Em Portugal,
quando se pretendia dizer que um médico era verdadeiramente generoso e desinteressado,
contava-se dele que, não só não cobrava as consultas aos pobres, como lhes dava
do seu bolso dinheiro para os medicamentos. É o que Júlio Dinis diz de João
Semana.
João Semana não
acreditava nos avanços da Medicina. Teria certa razão. No tempo em que Joaquim
Coelho escreveu (1860-1870), a terapêutica médica eficaz era ainda uma
promessa. Segundo António Lobo Antunes, a figura de João Semana não nasceu do
nada. Júlio Dinis inspirou-se, para a elaborar, na personagem dum certo doutor Silveira que a tradição popular fizera
quase santo.
Para Maria José
Oliveira Monteiro (“Júlio Dinis e o enigma da sua vida”), o modelo em que o
escritor se inspirou para criar o seu João Semana seria outro: o Dr. Joaquim
Silvestre Correia da Silva, de Grijó, povoação onde o escritor passou boa parte
da sua infância.
Sobre Júlio Dinis escreveu Camilo, em carta a António
Feliciano de Castilho, datada de
2/11/1867:
O autor da Pupilas do Abade é cirurgião
e lente na escola do Porto. Deve ter 37 anos. É um sujeito doente e triste.
Parece-me que tem muitíssima aptidão para a novela. Li, e disse cá ente mim:
Jam nova progenies, etc. Aquilo é rebate de entroixar eu a minha papelada, e
desempeçar a estrada à nova geração.
Texto retirado
do capítulo “Relação Médico doente na Literatura Portuguesa”, do livro a
integrar no Processo de candidatura da Relação médico doente a Património
Imaterial da Humanidade.
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