Histórias da Medicina Portuguesa

No termo de uma vida de trabalho, todos temos histórias a contar. Vamos também aprendendo a ler a História de um modo pessoal. Este blogue pretende viver um pouco da minha experiência e muito dos nomes grandes que todos conhecemos. Nos pequenos textos que apresento, a investigação é superficial e as generalizações poderão ser todas discutidas. A ambição é limitada. Pretendo apenas entreter colegas despreocupados e (quem sabe?) despertar o interesse pela pesquisa mais aprofundada das questões que afloro.
Espero não estar a dar início a um projecto unipessoal. As portas de Histórias da Medicina estão abertas a todos os colegas que queiram colaborar com críticas, comentários ou artigos, venham eles da vivência de cada um ou das reflexões sobre as leituras que fizeram.

quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014



      A MEDICINA EM MACAU
                              IV

                ATAQUE A UMA LEPROSARIA

O padre Manuel Teixeira era uma das figuras típicas de Macau. Dava nas vistas com o seu hábito branco e as longas barbas da mesma cor. Dizia-se que era malandreco e que apreciava as tailandesas, mas maldizentes há-os em toda a parte.


Mesmo já avançado em anos, dava longos passeios a pé pelas ruas de Macau. Com alguma frequência, para fazer exercício, percorria a «ponte velha» nos dois sentidos. «Ponte velha» é o nome que dão os macaenses, à ponte que liga a península de Macau à ilha da Taipa, apesar de ter sido concluída apenas em 1974. Foi projetada por Edgar Cardoso. Com mais de dois quilómetros e meio de comprimento, chegou a chegou a ser considerada «a ponte contínua mais longa do mundo».
Toda a gente o conhecia. Ofereciam-lhe boleia, quando passavam por ele de automóvel.
─ Senhor padre… Quer boleia?
Monsenhor Manuel Teixeira recusava sempre. Se insistiam, zangava-se.
Quando adoeceu, passou muito tempo no Hospital Conde S. Januário, após a recuperação. Como não podia residir ali, o governo de Macau acabou por lhe pagar um quarto na pousada.
Depois de 77 anos em Macau, Monsenhor Manuel Teixeira regressou a Portugal. Em vez da terra natal (Freixo de Espada-à-Cinta), escolheu Chaves para passar os dias finais da sua vida. Declarara repetidamente tencionar «acabar» em Macau. Poderá ter entristecido com a transferência da soberania de Macau para a República da China e com o êxodo da população europeia.
No aeroporto, o missionário foi recebido pelo último governador português de Macau, general Rocha Vieira. Instalou-se no Lar de Santa Marta, ao qual doara, ao longo de várias décadas, quantias importantes de dinheiro.  

MACAU - ANTIGA PRAIA GRANDE, HOJE OCUPADA POR EDIFICIOS

Depois de mais este apontamento biográfico, vou transcrever um relato curioso dos muitos em que o livro de Manuel Teixeira é fértil. Este blogue intitula-se historinhasdamedicina. Pretende, desde o início, dar realce às historiazinhas que acontecem no decurso da História.

A 3 de setembro de1885, o tenente Lemos enviou um ofício à secretaria do governo:
«Pelas 20 horas da noite do primeiro do corrente assaltaram o hospício de Kao hó, uns doze piratas armados de taifós (espadas curtas) e de pistolas, roubando toda a roupa de inverno das leprosas e o arroz que lhe havia sido distribuído para o rancho até 15 deste mês.
Os piratas dirigiram-se primeiro à casa do guarda, a cuja porta bateram para que viesse apresentar-se ao comandante da Taipa ─ disseram eles que estava ali à sua espera.  
O guarda foi o primeiro roubado.
Dali foram ao hospício, arrombaram a janela do lado da cozinha por onde entraram, e abriram em seguida uma porta.
Roubaram aí a roupa das leprosas e algum dinheiro na importância de sete patacas e 160 cates de arroz.
Pela meia-noite retiraram os piratas embarcando num pequeno sapatião que os esperava na praia.
Já mandei proceder a concertos da janela, em virtude da autorização que recebi para esse fim.»

As suspeitas recaíram em Lao teng yao e nos seus companheiros, que foram presos cerca de três meses depois em Cantão por outros crimes de pirataria, praticados na vizinhança de Hong Kong. O grupo tinha um nome pomposo - sociedade secreta Sam-hap, mas os seus membros levavam uma existência miserável e frequentavam uma casa de ópio.  
Em 1959, a forma clínica mais frequente de lepra em Macau era a tuberculoide. Atingia 28 dos 47 doentes internados na leprosaria de Ká-Hó, na ilha de Coloane.  A proporção dos doentes tratados em consulta externa era semelhante. 

FOTOGRAFIAS: RETIRADAS DA INTERNET.

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