Histórias da Medicina Portuguesa

No termo de uma vida de trabalho, todos temos histórias a contar. Vamos também aprendendo a ler a História de um modo pessoal. Este blogue pretende viver um pouco da minha experiência e muito dos nomes grandes que todos conhecemos. Nos pequenos textos que apresento, a investigação é superficial e as generalizações poderão ser todas discutidas. A ambição é limitada. Pretendo apenas entreter colegas despreocupados e (quem sabe?) despertar o interesse pela pesquisa mais aprofundada das questões que afloro.
Espero não estar a dar início a um projecto unipessoal. As portas de Histórias da Medicina estão abertas a todos os colegas que queiram colaborar com críticas, comentários ou artigos, venham eles da vivência de cada um ou das reflexões sobre as leituras que fizeram.

quinta-feira, 13 de junho de 2013


                                



Hoje vou falar de um romance meu que nada tem a ver com a Medicina nem com a sua História. Trata-se de uma reedição, agora on-line, com muitas páginas novas.
Nas últimas décadas do sec. XIX, algumas nações europeias deitaram olhares cobiçosos ao continente negro. Os sinos em Lisboa tocaram a rebate e a emigração para África ganhou prioridade. A Colónia Sá da Bandeira foi projetada, com régua e esquadro, por volta de 1881, nas secretarias do Ministério da Marinha e Ultramar.
Portugal exportou a pobreza para África. Um punhado de colonos madeirenses foi transplantado da sua ilha para as terras altas do sul de Angola.
       Narro a saga de uma dessas famílias. É uma história de amor e também de sonhos, trabalhos, sofrimentos, alegrias, desilusões, combates e morte. Homens e mulheres enraizaram-se na terra e chamaram-lhe sua. Mudaram a África e foram transformados por ela.
Acho que é um livro bonito. Pode ser descarregado das livrarias on line ligadas à Leya: Leya on line, ibooks, Amazon, Apple, Kobo, Google…

domingo, 9 de junho de 2013

           O BATATA RESOLVE



Tempos atrás, em Águas de Moura, nasceu um dito que se empregava em casos de doenças crónicas ou resistentes ao tratamento:
─ O Batata resolve!
Quando um velho, sentado à mesa da taberna, se queixava do reumatismo, havia sempre um companheiro que garantia:
─ O Batata tira-te as dores.
Se a bronquite não passava, ou se um doente regressava de Setúbal desiludido com os cuidados de algum especialista médico, alguém comentava:
─ O Batata resolve…
O Batata resolveu, na realidade, muitos problemas de saúde intricados. Não era curandeiro nem endireita.  Foi o coveiro da terra durante perto de 50 anos.



sábado, 1 de junho de 2013

                RECORDANDO BORGES D` ALMEIDA




A Revista da Ordem dos Médicos de novembro de 2012 traz um artigo da autoria do dr. Santos Bessa, dirigido à memória do dr. Borges d` Almeida. Faleceu há um ano. Registo aqui a minha homenagem.
Quando eu era interno de Neurocirurgia, ocorreu uma modificação na organização das equipas de urgência do Hospital de S. José e houve que escolher alguém para rodar semanalmente com ele. O dr. Borges d` Almeida, a quem médicos e enfermeiros conheciam por “Pipi” Borges, tinha uma fama péssima. Não se apresentaram voluntários. Procedeu-se a um sorteio e calhou-me a bola preta.
Trabalhar com o “Pipi” Borges revelou-se uma surpresa agradável. Borges de Almeida era inteligente, gentil e cultivava um sentido de humor ácido mas original. Acompanhava as atividades diversificadas da maior Urgência de Lisboa com um interesse em que se misturavam o sentido de responsabilidade, o saber, a experiência e a curiosidade. Tal como os outros chefes de equipa, era acompanhado, nas visitas sistemáticas, pela totalidade do “staff” médico disponível.
Em tempos em que a contabilidade tomou conta da saúde, imagino o horror dos burocratas a pensar que os atos médicos eram partilhados por um bando de trinta clínicos de saberes e especialidades diversas.
Numa altura em que muitos cirurgiões gostavam de se identificar com a imagem de garanhão, o “Pipi” Borges proclamava:
─ Dizem que todas as mulheres são iguais. Assim, não vejo razão para trair a minha…
Ocasionalmente, falava-se de dívidas e de pagamentos. Borges de Almeida pontificava:
─ Entrei, pelo casamento, para uma família de banqueiros. Nunca vi nenhum com pressa de pagar as suas contas…
Naquele tempo, eu era conotado com a Esquerda política. Uma vez por outra, o “Pipi” Borges lançava-me farpas a que eu respondia com respeito e com firmeza. O meu chefe de Banco não se aborrecia. Agradava-lhe a controvérsia.
No dia 26 ou 27 de outubro de 1975 estive de urgência com ele. As forças alinhadas à direita do Partido Comunista tinham acabado de tomar o Poder em Portugal. Mal me avistou ao fundo do corredor, o “Pipi” Borges fez luzir a dentadura num sorriso alegre.
─ Então, doutor Trabulo, a reação “passarou”?
Não sei o que lhe respondi. O homem tinha graça.
Hoje, recordo-o com saudade. Borges d` Almeida foi um dos expoentes duma das últimas gerações de grandes cirurgiões de Banco de S. José, ao estilo do “grand patron” francês.


Nota: Não dispondo de fotografias do dr. Borges de Almeida, reproduzo aqui a que acompanha o artigo do dr. Santos Bessa.