Histórias da Medicina Portuguesa

No termo de uma vida de trabalho, todos temos histórias a contar. Vamos também aprendendo a ler a História de um modo pessoal. Este blogue pretende viver um pouco da minha experiência e muito dos nomes grandes que todos conhecemos. Nos pequenos textos que apresento, a investigação é superficial e as generalizações poderão ser todas discutidas. A ambição é limitada. Pretendo apenas entreter colegas despreocupados e (quem sabe?) despertar o interesse pela pesquisa mais aprofundada das questões que afloro.
Espero não estar a dar início a um projecto unipessoal. As portas de Histórias da Medicina estão abertas a todos os colegas que queiram colaborar com críticas, comentários ou artigos, venham eles da vivência de cada um ou das reflexões sobre as leituras que fizeram.

sábado, 22 de abril de 2017


HIPÓCRATES




Hipócrates seria um nome corrente, na Grécia de Péricles. Diz Fernando Namora: “conhecem-se sete médicos de nome Hipócrates; a tradição tê-los-á amalgamado num personagem único”. Há quem sugira que sucedeu o mesmo com Jesus Cristo.
Sabe-se alguma coisa sobre a sua vida. Nasceu por volta de 460 a. C., em Cós. Cós é uma ilha grega situada muito próximo da costa da Turquia. Era cerca de dez anos mais novo do que Sócrates e foi contemporâneo de Demócrito. Julga-se que viajou pela Grécia e pelo Próximo Oriente. É representado de chapéu e bordão, símbolos do caminheiro.


Hipócrates era um asclepíade, isto é, um descendente de uma família dedicada aos cuidados de saúde. Sua mãe teria sido uma parteira de sucesso.
O mestre grego exerceu medicina na Trácia, na Tessália e na ilha de Tasso. Era já um médico conhecido em 430 a.C., quando se realizou a 86ª Olimpíada. Faleceu em Larissa, numa idade avançada.
É considerado uma das figuras mais importantes da História da Medicina. Segundo Catiglione, o seu mérito assenta em ter demonstrado que a doença era um processo natural. Os sintomas traduziam reações do corpo à doença e o papel principal do médico consistia em ajudar as forças naturais do organismo no processo de recuperação.
      Hipócrates separou a Medicina da Magia. As divindades já não eram convocadas para tratar os enfermos. Nascia a profissão de médico, o qual devia observar, refletir e aprender. No seu modo de ver, muitas doenças eram influenciadas por fatores climáticos, dietéticos e ambientais.
      Embora o juramento hipocrático, tal como o conhecemos hoje, ponha em realce a figura do mestre, em outros escritos, Hipócrates menorizava a aprendizagem pelo ensino, pela transmissão da experiência de outros, o que reforça a opinião dos historiadores que consideram ter sido o “Juramento de Hipócrates” elaborado numa data posterior. Hipócrates escreveu nos seus aforismos que a vida dum médico era demasiado curta para ele aprender tudo de que necessitava para o exercício da sua profissão.
A reputação de Hipócrates deve-se às suas obras, que constituem o Corpus Hipocraticum. O tempo terá reunido, nesta coleção de 70 escritos, contributos do próprio Hipócrates e de vários outros médicos oriundos de épocas e de escolas diferentes. Além do famoso Juramento, dos Aforismos e da Doença Sagrada, os textos falam das doenças agudas, da cirurgia, das fraturas, dos instrumentos de redução, dos ferimentos da cabeça, das articulações, das úlceras, das fístulas, das hemorroidas, dos ares, águas e lugares, das epidemias e dos prognósticos.
Hipócrates apreciava a temperatura do corpo com a mão. Praticava a auscultação, encostando o ouvido ao peito do doente. Descreveu o ruído do roçar de coiro novo nas pleurisias. As obras que lhe são atribuídas englobam um conjunto de descrições clínicas que permitem identificar doenças como a malária, a papeira e a tuberculose. Aconselhava os médicos a serem comedidos nas explicações e nas expectativas a transmitir aios doentes.
Hipócrates desenvolveu o conceito de “crise”. Constituiria um ponto-chave da evolução da doença e determinaria a recuperação ou a morte.
O médico grego não poderia enxergar muito além da sua era. Fundamentou a sua compreensão do organismo humano na famosa teoria dos humores (sangue, fleugma ou pituíta, bílis amarela e bílis negra). O equilíbrio dos humores (eucrasia) determinaria o estado de saúde, enquanto o predomínio de um ou de outro, a discrasia, seria causa de doença e de dor. Esta teoria, retomada séculos mais tarde por Galeno, dominaria o ensino médico até ao século XVIII.


Em questões terapêuticas, o Mestre de Cós não inovou. Recorreu ao que existia na época para tratar os doentes: sangrias, ventosas, cataplasmas e pensos.
Para terminar, registo aqui algumas passagens do famoso Juramento de Hipócrates.
Aplicarei os regimes para o bem do doente segundo o meu poder e entendimento, nunca para causar dano ou mal a alguém. A ninguém darei por comprazer, nem remédio mortal nem um conselho que induza a perda. Do mesmo modo não darei a nenhuma mulher uma substância abortiva.
Conservarei imaculada minha vida e minha arte.
Em toda a casa, aí entrarei para o bem dos doentes, mantendo-me longe de todo o dano voluntário e de toda a sedução sobretudo longe dos prazeres do amor, com as mulheres ou com os homens livres ou escravizados.
Aquilo que no exercício ou fora do exercício da profissão e no convívio da sociedade, eu tiver visto ou ouvido, que não seja preciso divulgar, eu conservarei inteiramente secreto.


Bibliografia
Alzina, A. Hipócrates: filosofia e mistérios em Medicina grega. Nova Acrópole (Internet).
Barradas, Joaquim. A arte de sangrar de cirurgiões e barbeiros. Livros Horizonte, Lisboa, 1999.
Namora, F. Deuses e demónios da Medicina. Livraria Bertrand, Amadora, 1979.
Wikipedia.


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