Histórias da Medicina Portuguesa

No termo de uma vida de trabalho, todos temos histórias a contar. Vamos também aprendendo a ler a História de um modo pessoal. Este blogue pretende viver um pouco da minha experiência e muito dos nomes grandes que todos conhecemos. Nos pequenos textos que apresento, a investigação é superficial e as generalizações poderão ser todas discutidas. A ambição é limitada. Pretendo apenas entreter colegas despreocupados e (quem sabe?) despertar o interesse pela pesquisa mais aprofundada das questões que afloro.
Espero não estar a dar início a um projecto unipessoal. As portas de Histórias da Medicina estão abertas a todos os colegas que queiram colaborar com críticas, comentários ou artigos, venham eles da vivência de cada um ou das reflexões sobre as leituras que fizeram.

terça-feira, 5 de julho de 2011

A MORTE DE MANUEL PLÁCIDO




Em 1873, Manuel Plácido, filho de Ana Plácido e provavelmente de Camilo Castelo Branco, embarcou para Luanda, na companhia do morgado de Pereira, António José Pereira Coutinho. Tencionava estabelecer-se como comerciante. 
Camilo relatou a hesitação da mãe em deixá-lo partir. 
Manuel mostrou-se determinado. Regressou a Portugal dois anos depois. Aparentemente, não trouxe dinheiro nem juízo. Veio a falecer, na Póvoa de Varzim, a 17 de Setembro de 1877. Camilo escreveu que o jovem morreu de meningite. 


A sua doença e ao mesmo tempo agonia durou quatro dias. Cheguei à beira do seu leito cercado de amigos, quando a febre cerebral deixara entrar na sua alma um raio de luz, uma intermitência de razão.
Amparei-o nos braços e senti na rigidez inflexa daquele corpo que a vida se lhe despedaçava.
Adeus Manuel, filho do meu coração.




Camilo negou sempre a paternidade do Manuel, mas chorou-o como se fosse pai.
Embora não se conheçam antecedentes pessoais de paludismo, a estadia numa região endémica de malária e a doença fulminante do jovem Manuel obrigam a pôr a hipótese de ele ter sido vitimado pela forma cerebral da malária. O paludismo cerebral evolui com cefaleias, sonolência, transtornos mentais agudos e coma. Os sinais meníngeos clássicos não são frequentes, mas podem ocorrer, confundindo o diagnóstico. Em Angola, predomina a modalidade falciparum da doença. Nesta forma, as recaídas em geral desaparecem no termo de um ano, mas podem ocorrer mais tarde. 
Os parasitas do paludismo foram descobertos por Laveran, em 1880. Dificilmente a ajuda laboratorial estaria disponível em Portugal sete anos depois. 

Expirou-me nos braços Manuel Plácido, filho de D. Ana. Tinha dezanove anos. D. Ana encaneceu e agora mesmo a estou ouvindo chorar. Esta casa é uma tristeza sem nome nem esperança de alegria. 

Fontes:
Cabral, Alexandre. Dicionário de Camilo Castelo Branco. Caminho, 1988.
Trabulo, António. Eu, Camillo. Parceria A.M.Pereira, 2006.
Viale Moutinho, José. Camilo Castelo Branco - Memórias Fotobiográficas. Caminho, 2009.
Imagens Camilianas.

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