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O Professor José Bacalhau não era uma pessoa comum. Depois de ter estado afastado, durante vários anos, da Faculdade de Medicina de Coimbra por questões não sei se internas se externas à Universidade , regressou para terminar a carreira no lugar que era seu. Homem de fraca figura, adorava representar.
Criara, em benefício dos alunos, uma série de aforismos médicos que chegara a publicar. Haviam de acudir aos clínicos de vilas ou aldeias se o estudo não fosse muito e a memória lhes falhasse. A minha deve estar a falhar bastante, pois só me lembro de um: "Gástrico a salivar, de cancro desconfiar".
Naquele tempo, as aulas teóricas eram de assistência facultativa e as práticas obrigatórias. Para garantir uma audiência que lhes confortasse os egos, muitos professores promoviam as teóricas a teórico-práticas. As faltas eram assinaladas pelo bedel.
Lá estava, no salão (creio que era o "nobre") do hospital antigo, uma centena de alunos ensonados a esforçar-se por ouvir o Mestre de Propedêutica Cirúrgica.
Para ser prática, a aula obrigava à presença de doentes. Recordo um velho baixinho sentado numa cadeira colocada um pouco à esquerda e à frente da secretária do Professor. Olhava o auditório com receio. Seria assim que as vítimas encaravam os anfiteatros romanos.
O Professor José Bacalhau começou a colheita da História Clínica pelos antecedentes.
- O senhor fuma?
- Não, senhor professor.
- O senhor bebe?
- Não, senhor professor.
- O senhor anda com mulheres?
- Não, senhor professor...
José Bacalhau sacou um berro do fundo da alma:
- O SENHOR É UM BURRO!
O pobre doente fez-se ainda mais pequeno.
A risada cruel da turma terá satisfeito a ânsia de ribalta do professor de cirurgia. Também me ri, mas saí da aula a pensar que, quando adoecesse, preferia internar-me num hospital não escolar.
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